A independência política do Brasil completa 200 anos. Para além das motivações e das interpretações dos fatos que levaram a proclamar a independência, resta de verdadeiro que a proclamação da independência foi um fato marcante e benéfico, que deu início a uma etapa nova na história do povo brasileiro. Não todos os problemas foram resolvidos com esse ato constitutivo formal da existência do Brasil como país; mas assumimos nosso próprio destino, sem a dependência formal de outro país, como era até então.
A comemoração do bicentenário da independência deveria ser motivo de festa para todos os brasileiros. É lamentável que a efeméride aconteça na fervura de uma campanha eleitoral, marcada pela polarização ideológica. Perdemos uma boa oportunidade de festejarmos de forma serena, alegre e irmanada a conquista da independência, sem a necessidade de temer confrontos com quem se julga mais brasileiro que os outros ou queira manipular os festejos em favor de seu cacife eleitoral. Deveria haver um veto à partidarização dos festejos da independência, bem como ao uso da bandeira brasileira.
O bicentenário da independência deveria nos ajudar a lembrar que o Brasil é uma grande comunidade humana, num imenso território, cheio de recursos naturais e possibilidades de vida. Esta comunidade humana não é homogênea, mas muito diversificada quanto à sua composição étnica, racial e cultural. A diversidade, no entanto, não é desdouro nem problema, mas riqueza humana e possibilidade de edificação de uma sociedade plural, em harmonia e fraternidade.
Nesta comemoração, é preciso também tomar consciência de que os efeitos benéficos da independência política ainda estão longe de beneficiar a todos os brasileiros de forma justa e equitativa. Grande parte da população ainda vive na dependência econômica e em condição de exclusão social. A diferença entre a pequena camada mais rica e uma imensa população brasileira pobre é abissal. Quando esses brasileiros que lutam cada dia pela sobrevivência poderão experimentar que a independência do Brasil também significa algo para eles?
Em 200 anos de sua história independente, é inegável que o Brasil deu passos enormes no sentido do progresso econômico e social. Acordou e já não jaz mais “eternamente em berço esplêndido”, formando uma comunidade política ativa e participativa. Procurou envolver-se também na comunidade das nações e participar ativamente das questões internacionais que dizem respeito à dignidade humana, à justiça e à paz entre os povos. Amadureceu, pouco a pouco, as suas instituições democráticas, mesmo sendo necessária a constante vigilância para não haver retrocessos autoritários. Ainda precisa aprender a conviver melhor com a diversidade de opiniões e ideias, a confiar no diálogo aberto e na contribuição plural para a edificação da sociedade. Oxalá não haja mais lugar, no presente e no futuro, para salvadores da pátria populistas.
Para nós, cristãos, vale lembrar que somos parte desta comunidade chamada Brasil. Aqui exercemos nossa cidadania, contribuímos para o bem comum e nos beneficiamos do convívio da comunidade nacional. Embora, à luz da nossa fé, estejamos a caminho da “pátria definitiva”, nosso caminho para a “Jerusalém celeste” se faz enquanto somos participantes da pátria terrena chamada Brasil. O amor à pátria não é sentimento vago nem ideal abstrato: é amor ao povo brasileiro e compromisso com o seu bem todos os dias. Não dá para ser bons cristãos sem sermos também bons brasileiros, com as virtudes humanas e cristãs que edificam o convívio social na retidão, justiça, solidariedade e paz. Cabe-nos participar ativamente na edificação da pátria comum, cada um com seu dom e suas capacidades.
Na comemoração do bicentenário da independência do Brasil, como pessoas de fé, agradeçamos a Deus por todos os benefícios já conseguidos para o povo brasileiro. Ao mesmo tempo, é preciso pedir perdão a Deus pelo muito mal que se fez, ou pelo bem que se deixou de fazer, vendo tantos brasileiros ainda em condições de sofrimento e miséria. Esta comemoração deveria despertar em todos o desejo de escrever belas páginas para a história que temos pela frente. Que Nossa Senhora Aparecida, Padroeira do nosso Brasil, interceda por todos os brasileiros.
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